Assinar um contrato-promessa de compra e venda é um passo comum na aquisição de imóveis em Portugal. No entanto, poucos compradores antecipam o risco de o vendedor entrar em insolvência antes da escritura definitiva. Quando isso acontece, surgem dúvidas sobre a validade do contrato-promessa, o destino das quantias entregues e as garantias legais do promitente-comprador.
Neste artigo, explicamos quais os efeitos da insolvência do vendedor num contrato-promessa e como o comprador pode resguardar os seus direitos, nomeadamente através da atribuição de eficácia real e registo predial.
1. O QUE ACONTECE AO CONTRATO-PROMESSA SE O VENDEDOR FOR DECLARADO INSOLVENTE?
Se o promitente-vendedor for declarado insolvente, o contrato-promessa que não tenha sido ainda cumprido (isto é, sem escritura pública realizada) pode ser afetado pelas regras do processo de insolvência. O administrador da insolvência pode:
- Optar pela execução do contrato, se entender que isso é do interesse da massa insolvente;
- Ou, pelo contrário, recusar o cumprimento, libertando a massa dos encargos do contrato-promessa.
A consequência para o comprador, neste último caso, é perder o direito à execução do contrato e passar a ser um simples credor comum, disputando com outros credores o reembolso das quantias pagas.
2. COMO PROTEGER-SE: EFICÁCIA REAL DO CONTRATO-PROMESSA
A melhor forma de proteção jurídica é garantir que o contrato-promessa tenha eficácia real.
A promessa de transmissão de bens imóveis pode ter eficácia real desde que:
- Contenha declaração expressa das partes atribuindo essa eficácia;
- Seja celebrada por documento particular com assinaturas reconhecidas, ou por escritura pública;
- E esteja inscrita no registo predial.
Quando o contrato-promessa tem eficácia real e está registado, o comprador adquire um direito oponível a terceiros, incluindo à massa insolvente. Em termos práticos, isto significa que, mesmo em caso de insolvência do vendedor, o comprador pode reclamar o cumprimento do contrato ou manter o direito ao imóvel.
3. O PAPEL DA EXECUÇÃO ESPECÍFICA
Em determinadas situações, o comprador lesado pelo incumprimento da promessa pode intentar uma ação judicial para obter a execução específica do contrato-promessa.
Contudo, em contexto de insolvência, a execução específica só será viável se o contrato tiver eficácia real e estiver registado antes da declaração de insolvência.
Caso contrário, o comprador terá apenas direito a reclamar o valor entregue, como credor comum no processo de insolvência — com menor probabilidade de recuperação integral do seu investimento.
4. O RISCO DO SINAL NO CASO DE INSOLVÊNCIA
Os montantes entregues a título de sinal estão sujeitos a perda ou a devolução em dobro, em caso de incumprimento culposo.
No entanto, em caso de insolvência do vendedor, a prática demonstra que é difícil reaver esses montantes sem a garantia conferida pelo registo do contrato com eficácia real. O comprador, neste cenário, é tratado como credor quirografário, sem privilégio.
5. RECOMENDAÇÕES PRÁTICAS PARA O COMPRADOR
- Inclua no contrato-promessa cláusula de eficácia real;
- Reconheça presencialmente as assinaturas e proceda ao registo no Registo Predial;
- Verifique a situação financeira do vendedor, incluindo eventuais penhoras, hipotecas ou execuções pendentes;
- Evite entregar montantes elevados sem garantias reais;
- Consulte um advogado antes de assinar qualquer contrato.
CONCLUSÃO
A insolvência do vendedor pode colocar em risco todo o investimento do promitente-comprador. Porém, a lei portuguesa oferece mecanismos de proteção – em especial, a atribuição de eficácia real ao contrato-promessa e o seu registo – que tornam o direito do comprador mais robusto e eficaz mesmo em situações complexas.




