Quando um estabelecimento comercial funciona num imóvel arrendado, a realização de um trespasse levanta questões importantes quanto ao contrato de arrendamento vigente.
Afinal, pode o arrendatário (vendedor do estabelecimento) transferir o seu negócio sem autorização do senhorio? Existe obrigação de notificação? O senhorio pode opor-se ou resolver o contrato?
Neste artigo, esclarecemos os principais aspetos legais da relação entre o trespassante-arrendatário e o senhorio, incluindo os deveres de comunicação, os prazos legais, o direito de preferência do senhorio e as consequências da inobservância dessas regras.
CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL NO ARRENDAMENTO
O arrendatário que trespassa o seu estabelecimento pode ceder a sua posição contratual no contrato de arrendamento ao novo titular (trespassário), sem necessidade de autorização prévia do senhorio.
No entanto, a lei exige que o trespassante, trespassário, ou ambos, comunique ao senhorio o trespasse do estabelecimento comercial.
OBRIGAÇÃO DE COMUNICAÇÃO AO SENHORIO
A cessão da posição contratual no arrendamento só produz efeitos perante o senhorio se for comunicada devidamente.
Caso essa comunicação não ocorra, a cessão é considerada ineficaz perante o senhorio, ou seja, é como se nunca tivesse existido o trespasse.
A comunicação ao senhorio deve respeitar os seguintes requisitos legais:
- Ser feita por escrito e assinada;
- Enviada por carta registada com aviso de receção;
- Realizada no prazo de 15 dias a contar da data da cessão (isto é, do trespasse).
A comunicação pode ser feita tanto pelo trespassante (vendedor) como pelo trespassário (comprador). A omissão da comunicação pode originar graves consequências legais.
EFEITOS DA FALTA DE COMUNICAÇÃO: RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Se o senhorio não for informado da cessão, poderá resolver o contrato de arrendamento com fundamento na violação do dever de comunicação.
Contudo, a resolução só é possível se o senhorio não tiver aceite ou reconhecido, expressa ou tacitamente, o novo inquilino, por exemplo, através da aceitação de pagamento da renda por parte do trespassário.
DIREITO DE PREFERÊNCIA DO SENHORIO NO TRESPASSE
Se o trespasse envolver venda ou dação em cumprimento, o senhorio tem direito de preferência na aquisição do estabelecimento.
Por isso, antes da celebração do contrato de trespasse, o arrendatário deve:
- Notificar o senhorio com antecedência;
- Apresentar o projeto de contrato e respetivas condições da transação;
- Incluir na comunicação os elementos do estabelecimento comercial a transmitir
Caso o senhorio deseje exercer o seu direito de preferência, deve fazê-lo nos prazos legais.
ALTERAÇÃO DO DESTINO DO ESTABELECIMENTO
Outro aspeto crítico diz respeito ao destino do imóvel arrendado após o trespasse.
O senhorio pode resolver o contrato de arrendamento se, após o trespasse:
- O trespassário mudar o ramo de atividade (ex.: transformar um snack-bar num restaurante gourmet);
- O imóvel passar a ter fim não empresarial (ex.: uso como habitação)
Mesmo que essa mudança de destino ocorra posteriormente ao trespasse, e sem intenção prévia, o senhorio pode exercer esse direito.
CONCLUSÃO
A realização de um trespasse de estabelecimento comercial em imóvel arrendado implica obrigações legais específicas relativamente ao senhorio.
Ainda que a cessão da posição contratual seja permitida sem autorização prévia, a sua validade depende da comunicação escrita e atempada ao senhorio.
Além disso, o direito de preferência do senhorio e a manutenção do uso comercial do imóvel são pontos-chave para evitar a resolução do contrato.
Compreender estas regras é essencial para garantir uma transição segura e legal entre as partes envolvidas no trespasse, protegendo tanto o negócio como a relação contratual com o senhorio.





