Com a adoção crescente de smart contracts, cresce também a importância de compreender a sua validade legal. Estes contratos executam-se automaticamente em código, mas possuem vínculos jurídicos sólidos somente se respeitarem as normas legais.
RECONHECIMENTO LEGAL DOS CONTRATOS ELETRÓNICOS
O Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, estabelece que:
- Artigo 24.º: é livre a celebração de contratos por via eletrónica, sem prejuízo da sua eficácia;
- Artigo 26.º, n.º 1: as declarações emitidas por via eletrónica satisfazem a exigência de forma escrita desde que o suporte garanta fidedignidade, inteligibilidade e conservação.
Ou seja, um contrato celebrado eletronicamente ou por meio automatizado, como os smart contracts, não perde validade legal simplesmente por não ser físico.
CONTRATAÇÃO TOTALMENTE AUTOMATIZADA
O artigo 33.º do mesmo Decreto-Lei regula a contratação sem intervenção humana, aplicando o regime geral:
- Em caso de erro de programação, aplica-se o regime de erro na formação da vontade;
- Se houver defeito no funcionamento da máquina gera-se erro na declaração;
- Se uma mensagem eletrónica for corrompida, há erro na transmissão.
Portanto, mesmo num processo totalmente automatizado, é possível haver responsabilidade jurídica adequada.
LIMITES LEGAIS E PRINCÍPIOS DE DIREITO CONTRATUAL
Apesar da automação, os smart contracts não podem ignorar os princípios jurídicos fundamentais:
- Irrenunciabilidade dos litígios: não podem excluir o direito ao recurso judicial;
- Invalidade contratual: as operações podem ser anuladas se houver falta de requisitos essenciais.
A ideia de que o código privado dispensa o direito ou torna os contratos irrecorríveis é juridicamente inválida. Tais contratos inteligentes só terão validade se permitirem a resolução por mecanismos legais existentes.
A RELAÇÃO ENTRE O CÓDIGO E O CONTRATO
Na ótica jurídica:
- O contrato só existe se houver vontade humana expressa, explícita ou implícita;
- O código representa o acordo, mas não substitui o contrato em si;
Um smart contract só se torna vínculo jurídico quando traduz um acordo prévio entre partes. Por si só, um smart contract não é um contrato: depende do contexto em que o código é executado, carecendo a vinculatividade deste de um acordo prévio entre as partes. Apenas a partir do momento em que seja possível imputar declarações de vontade temos um contrato.
CONTEXTOS DE AUTOEXECUÇÃO E ADESÃO
Mesmo em sistemas automatizados de adesão a programas predefinidos, a partir do momento em que existe imputação de vontade ao aderente, formam-se vinculativamente obrigações contratuais. O smart contract pode resultar de adesão a termos predefinidos ou de automação pura, mas, em ambos os casos, depende de vontade imputável à parte que adere ou executa.
CONCLUSÃO
Os smart contracts em Portugal são juridicamente válidos quando:
- São celebrados por via eletrónica;
- Há vontade humana traduzida em código ou condição de adesão;
- Respeitam princípios fundamentais do direito contratual.
Embora prometam execução automática e eficiência, não podem substituir o direito: devem existir mecanismos legais para tratar erros, litígios ou invalidades. A sua total exequibilidade depende da conformidade com a lei aplicável.





